[Habitação Multifamiliar, Ourém, 2003-2005]
Rendez visible ce qui, sans vous, ne pourrait être vu.
Robert Bresson
Poeticamente, o homem habita a terra.
Heidegger, após Hölderlin
Quebrar a distância entre a representação e o objecto é o mister deste arquitecto-construtor. A estética é o território onde labora silenciosa a construção. Organizar o espaço é construir um mundo. A estética da desocultação daquilo que sem a construção permaneceria longe dos olhos. Um lugar é essa evidência após o trabalho da arquitectura.
Construir, o devir da arquitectura, é metafísico e epistemológico: um lugar no mundo ao qual cada homem é convocado a participar pelo motivo único que de viver pode ser a necessidade arcaica de se procurar um lugar no mundo.
As coisas não se juntam ao acaso: a poesia nomeia o sobressalto daquilo que se desconhece; a arquitectura como a construção desse lugar que se desconhece que se deseja da fabricação (pós-religiosa) da beleza que nos transcende.
Aqui o discurso científico é estéril e a técnica vazia. «Procuro o absoluto e apenas encontro coisas», cito de cor Novalis, e o desespero do homem moderno, contra a alienação do qual Nietzsche se insurge – na crítica incessada aos valores do cristianismo hipócrita e tíbio.
O elogio de Nietzsche, o seu pensamento sobre o fenómeno da arquitectura, é uma esperança na possibilidade última da resistência humana à sua própria fraqueza num mundo sem Deus. A vontade do «eu» contra a consciência aguda da sua própria debilidade. O edifício é a ontologia e a epistemologia: dá testemunho de si mesmo no espaço que constrói; traduz na pedra aço vidro betão a sua própria memória do mundo. O homem arquitecto-construtor é o que se constrói a si mesmo. Na memória [de] pedra.