§280


[Enigma do Oráculo, De Chirico, 1910]



Arquitectura para uso daqueles que procuram o conhecimento.
Será necessário reconhecer um dia – e penso que tal dia há-de chegar depressa – que aquilo que mais falta nas nossas cidade são “pensadouros” silenciosos e espaçosos, lugares amplos, com elevadas e compridas galerias para o mau tempo e o ar livre, onde o rumor das viaturas e os gritos dos comerciantes não penetrem e onde o tacto proíba mesmo aos padres de rezar em voz alta: edifícios e passeios que exprimam pelo seu conjunto a sublimidade da meditação e do isolamento. Passou o tempo em que a Igreja possuía o monopólio desta meditação, em que a vita contemplativa devia começar necessariamente por ser uma vita religiosa: porque esta ideia ressalta de tudo o que ela construiu. Não vejo como poderíamos acomodar-nos nesses edifícios, mesmo que perdessem a sua finalidade religiosa. Casas de Deus, teatros de aparato, comércios sobrenaturais, falam uma linguagem excessivamente enfática e muito acanhada para que aí possamos, ímpios, meditar os nossos pensamentos pessoais. Somos nós que devemos traduzir a pedra e a planta para que nos possamos passear em nós próprios, quando formos a essas galerias e a esses jardins.

[A Gaia Ciência, Friedrich Nietzsche]



Um lugar proeminente e ambíguo. O labirinto, ardil, ora uma prisão de onde se procura incessantemente a saída, ora um lugar que seduz pela vertigem que o constitui. E pode muito bem ser o caos que se procura. As profundezas do mundo. A mulher. O mysterium tremendum et fascinans ao qual somos atraídos mesmo que seja a atracão para a morte.
É a coragem que nos falha para que construamos os nossos edifícios a partir do modelo do labirinto?
O fascínio e a curiosidade que nos traz ao labirinto, a perigosa amizade de Adriadne com o Minotauro: «Há casos onde o que é necessário é o fio de Adriadne que nos conduz pelo labirinto. O que tem a tarefa de trazer para a guerra, a grande guerra contra o virtuoso, tem de ser capaz de passar por todas as experiências a qualquer preço. O preço poderá ser o perigo de se perder a si próprio
Como compreender esta necessidade de regresso ao labirinto? Labirinto e centro são juntos. A negação, derrube do que é centro e do que é exterior. O caminho que conduzimos por um escuro e perigoso labirinto e que nos guarda o seu centro mortal: a condição pela qual se tem de passar se quisermos aceder ao verdadeiro centro; à luz.
A penumbra pela qual pode chegar a realidade luminosa é o lugar onde cada som anuncia um perigo, onde o ouvido importa mais que o olho.