causas inconscientes

É latente o desconforto experimentado perante a palavra estética, dita num contexto arquitectónico. Usada como manifestação de alguns vulgares factos que sugiram não mais que um vago prazer visual, ou quando muito de uns outros sentidos difusos, é sempre dita como subterfúgio, defesa ou afirmação de uma resoluta vontade do arquitecto.
Uma disciplina nascida da revolução e vigor iluminista, que se propõe adquirir um pensamento sobre o belo, naturalmente, num contexto de escrupulosa veneração à matéria, à ciência, à tecnologia, resultaria num paradoxo evidente: como pensar e tornar pensável, racional, o que é da ordem da mais subjectiva relação do indivíduo com o mundo?
De certa forma The End of the Classical: The End of the Beginning, the End of the End aflora a sucessão de ficções a que recorreu a arquitectura depois do período iluminista, ainda que, em rigor, a tese de Eisenman assinale o corte com o clássico a partir do Renascimento, é, o uso pós-kantiano da expressão estética que é o motivo de algumas poucas disputas ou melancólicos silêncio.
Se na era clássica a estética era resultado de uma técnica, um conjunto de leis que mediavam o homem e o universo, a partir de um cânone que é isso mesmo, uma ressonância da ordem e do mistério cósmico talhado à escala humana, a morte de Deus e o eclipsar de qualquer ordem transcendental tornam inútil esta disciplina. Porque a verificação, a legitimidade, da arquitectura decorre da ciência, reduzindo-a a pouco mais que a fabricação técnica de espaços sem qualquer relacionamento com outras realidade (espirituais?) que não as sociológicas ou tecnológicas.


Do séc. XVII, restrospectivamente, apenas se poderiam alimentar disputas contra uma arquitectura que não fosse fundada no conhecimento racional do mundo. Com argumentos pretensamente universais que cedo amputariam quaisquer tentativas, sempre vistas como reaccionárias, de uma arquitectura outra que recorresse a leis que não as da razão e da matéria.
O pós-I Guerra Mundial foi o momento propício para, a partir da destruição da Europa, se erguer uma arquitectura higienicamente extirpada de elementos decorativos, convenientemente calculada para a produção industrial. O modernismo, no seu impulso totalitáro, materialista e científico, envidentemente que só se poderia impor, pela negação da História e, desse modo, precipitando a morte do estilo – como o são o estilo jónico ou dórico, como vislumbre, na pedra, de uma ordem transcendental.
Venturi ainda recuperou a história, mas demitiu-se de ir mais adiante que a invenção da figura do arquitecto não mais que um manipulador de símbolos para enfeitar os pavilhões de critério científico, a maior parte dos quais desenhados por engenheiros.

Rapidamente tudo se repete e propaga, imagens de imagens de imagens de arquitecturas deslumbrantes, hiper-modernas, hiper-cosmopolitas, (que, por um processo autofágico são elas próprias sancionadas pelas próprias imagens do que por outra ciência), contíguas a arquitecturas construídas com as sobras do hiper-capitalismo, deslocadas para a invisibilidade e apagadas no photoshop dos roteiros turísticos que reforçam a nossa condição de espectadores.
A paisagem arquitectónica global segue o ritmo da monotonia interrompida por espasmos e orgasmos de imagens que apresentem a cada momento o absolutamente novo, belo ou horrível, já não para deleite dos sentidos mas reduzido às primícias e exigências dos egos feridos da profissão. Qualquer coisa de psicanalítico, que os arquitectos agora insistem em chamar de estética.


[Museu da Imagem e do Som, Diller Scofidio, Copacabana, Rio de Janeiro]