depois do riso
[Golden Tulip Amsterdam, Molenaar & Van Winden, Amsterdão, 2010]
Os clichets serão a redundância dita da constatação dos ínfimos gestos dos dias, repetidos por todos. Lugares comuns do quotidiano. Um deles diz que à simplicidade apenas acedem os sábios. E a sabedoria exige sageza. Pouco sagaz, e sábio, será aceitar o jogo que Wilfried van Winden propõe em Zaandam. E pode até a arquitectura compreender a artimanha lúdica, e compreenderá, acredito, no prazer e na alegria dos instantes do projecto. A dor, não se discute. Mas aceitar o trabalho da arquitectura como mera recreação pode ser um caminho perigoso. E manipular a história e os símbolos como sortilégio da vontade pode resultar numa catástrofe. A mesma que decorre se dividirmos a história da arquitectura moderna como um combate entre a expressividade e o funcionalismo.
Temos, portanto, aquilo que se apresenta como um disparate arquitectónico, pela aparência da manipulação de linguagens históricas, ou vernaculares, talvez com mais rigor, e pelo propagar de um discurso populista, quando não demagógico, numa aparente leviandade que, talvez com mais rigor, ou será puro cinismo – e daí não virá mal ao mundo – ou pura tentativa, política, de manipulação de imagens populares – e começará aqui um caminho perigoso.
O riso, a citação, a ironia, eram moda há vinte anos, nos famosos anos oitenta da loucura pós-moderna. Hoje é apenas nostalgia. Uma forma nova de pornografia, talvez, que actua pelo retomar daquilo que na aparência parece um passado glorioso e obriga a perseverar, adormecer, na melancolia de coisas que no presente, à distância, surgem despidas de ideologia. Foi bonita a festa anos oitenta, pá. Eram outros os tempos e a vontade era a do triunfo do prazer. E a psicose do prazer propagou-se até estourar com estrondo em Wall Street em Outubro de 2008. O fim do simulacro anunciava-se na queda do Lehman Brothers, na bolha imobiliária (arquitectónica) que explodia, na nova incerteza que contaminava o quotidiano – a segurança – de milhões.
E o discurso não é mais tranquilizador: Fusion Architecture? Uma nova expressividade? Um novo ethos? Misturar, a la carte, o passado e o presente, a alta e a baixa cultura? Pobre Michael Graves, parece que foi há uma eternidade.
Problema meu, não entender este tipo de humor. Somos, claro, seres ridentes, mas creio ser de temer quando depois do riso sobra a náusea.
- | João Amaro Correia / 23.5.10
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