Ugly Duck: Decorated Shed






As categorias críticas de Venturi [Learning form Las Vegas, 1972], Duck e Decorated Shed - only in America -, poderão não nos transportar para qualquer beco da moral. Estas categorias servem-nos apenas como observações do real sem qualquer intenção judiciosa.
Mas se o Duck é o símbolo ele-mesmo da construção que não é outra coisa que não si própria que se revela em perfeita integridade e completude - da forma à função; do programa à interpretação deste como manifestação das condições económicas, sociais, culturais, políticas do seu contexto –, a Decorated Shed é uma estrutura, genérica, com propósito apenas identificável e tornado apreensível pela sinalização: sem estes ser-nos-ia impossível entendermos de que edifício se trata ou o que contém no seu interior.
Se no Duck o ornamento não é um crime mas um facto inerente ao pensamento que sustenta a arquitectura - what you see is what you get -, a Decorated Shed não subsiste sem ornamentação aplicada que esconde a verdadeira estrutura.
É isto uma questão iminentemente política? Moral?
O que é a Verdade?
Sem lavar as mãos de um debate destes Evo Morales, presidente da Bolívia desde 2006, leva a cabo uma campanha de valorização das culturas indígenas. Não importa se a troco de doses intoxicantes de demagogia e pura estupidez ‘progressista’, importa as consequências culturais desta ‘valorização’. Assim, o prolífico arquitecto Freddy Mamani Silvestre interpreta virtuosamente esse esforço de aggiornamento de uma mítica cultura andina, esmagada, obviamente, pelos cinco séculos de devastadora colonização do monstruoso homem branco heteressexual europeu.
Mas a verdade é que o resultado, para além de um fulgurante circo de significantes mítico-andinos, é o significado de um mundo cada vez mais exíguo na possibilidade de afirmação de identidades, um mundo onde essa afirmação é em si mesma refém dos mecanismos do ‘capitalismo global’ que tudo uniformiza e padroniza, onde tudo se submete a um único modelo de visibilidade/comunicação/consumo. Uma casa em La Paz, igual a tantas outras de um subúrbio americano ou de um mandarim neo-tradicionalista em Xangai. Um caixote forrado a pagode chinês ou uns motivos andinos: é tudo igual.
Talvez Evo Morales ou o próprio Freddy Mamani Silvestre se apercebam desta (in)diferença e do paradoxo político e, para o que nos interessa, estético e cultural. E talvez o usem para fins manifestamente (política e moralmente) condenáveis.
Ainda assim, a esperança assume a forma de uma dança feliz e celebrativa dentro de uma qualquer Decorated Shed em qualquer lugar deste mundo cada vez mais indiferente.