on ne peut montrer le chemin à celui qui ne sait où aller*



Uma fronteira que não tem nada do outro lado.

Esperar é um modo de especular, de fixar, no horizonte, um ponto onde quem espera se pode inscrever, ou, mais rigorosamente num gerúndio, inscrevendo. Esperar, como o amante espera a amada, o ladrão a noite, o soldado a guerra, é a permanente vigília que não se permita à distracção das coisas abaixo do horizonte. É ter miragens, alegorias abstractas do que se espera. É desesperar na memória que se vai elidindo daquilo que se vislumbrou, fugaz, outrora.

Pedras… Areia… Pó…
Subsistir nessa memória é ficar à mercê do lugar onde se permanece. Na memória da amante, da noite, do inimigo: uma fortaleza que se corrói um pouco mais a cada noite que passa – quando no dia se deseja a noite. É permanecer no deserto. Nada, para além dos olhos, do sono, do tédio. Da loucura.

Uma fronteira é uma fronteira.

Drogo, enviado a Bastiana, é, como todos os outros, lenta e inexoravelmente atraído à espera, vaga, de alcançar um dia um tártaro, o inimigo. Bastiana, o posto último do império guarda do deserto e a névoa da areia tocada pelo vento.
Bastiana [Bam, Irão] é a torre e o labirinto: a vigia ao deserto e a loucura da espera. Uma guerra iminente e o labirinto interior, sombrio, onde o oficial, jovem, aprende a morte. Porventura apenas se sustém e estrutura pelos rígidos e rituais códigos militares, no meio de nada, de um inimigo que o deserto torna impossível.
Na geopolítica da solidão, ganha a loucura. A guerra é a esperança última de que a distância e a espera, a vida, adquira um sentido.

Uma estrada? No deserto?
Quem poderá ser? E que utilidade teria?

Por hipótese não é Drogo, nem o tédio, nem a loucura, nem o inimigo ausente: será a fortaleza. A imensa muralha, escrita na areia, do que, misteriosamente, sempre permanecerá. E a resignação, uma arquitectura da solidão, e às vezes a alegria. Encontrar abrigo numa cidadela que permita um breve descanso para, depois, mais uma jornada no deserto. E outra a seguir.

[O Deserto dos Tártaros, Valerio Zurlini, 1976]



*Antoine de Saint-Exupéry