liberdade e método




Creio que não tenho contacto com o folclore. As tradições, que servem de vínculo comum entre todos, têm mais a ver com o clima, com os condicionamentos práticos, com a qualidade das tragédias e comédias que nos tocaram viver. Não faço arquitectura marcadamente finlandesa e, genericamente, não vejo contraposição alguma entre o finlandês e o internacional. A Finlândia faz parte da Europa.

Alvar Aalto


É sempre um dilema, e um inquietante desconforto, querer atribuir uma génese nacional a uma obra, obra de arte ou arquitectura, para além da contingência do natural. Quase de imediato se ergue um fio político que, ainda que se mantenha longínquo, não deixa de trazer algum embaraço. Ainda que recorramos, e pretende-se, a um discurso intrinsecamente disciplinar.
A ideia de nação é já de si oscilante. E conflituosa. O conceito que evoluiu e que nos chega hoje, aqui em Portugal, como categorização de uma entidade, fixa nas suas fronteiras, (quase) rígida na sua cultura, monolítica na sua política, constitutiva de uma identidade, legitimadora de um poder e é já de si uma construção do(s) poder(es) sucessivo(s). E conflituosa, se é deste objecto enclausurado que se pretende avançar pelo(s) mundo(s). E ser-se cosmopolita não será necessariamente ser-se sem raiz.

E o alcance da afirmação de Aalto será tanto mais relevante quanto, tendo sido proferida por altura que lhe eram desferidos ataques pela ortodoxia do moderno – os «dandys das grandes metrópoles» apóstolos do «purismo inumano» -, desoculta na arquitectura uma essencial articulação da contingência, como método, e a adequação, justa e bela, ao «homem vulgar e corrente, ali onde ele é o centro, com a sua tragédia e a sua comédia», como objecto. Qualquer prática disciplinar que inventarie uma caracterização nacionalista, e que o faça como horizonte ideológico, pesa sobre a arquitectura como uma sentença de morte: seja a arquitectura uma hierarquização dos limites não poderá ela própria ser limitada no seu fazer-se por impulsos de outra ordem que não os do «homem vulgar e corrente, ali onde ele é o centro, com a sua tragédia e a sua comédia». E sabemos bem dessa tentação do cárcere.