Sínodo LGBT













Antes de mais, destas últimas semanas ficaríamos com a ideia de que o que sucedeu em Roma, ao invés de um Sínodo dos Bispos sobre a Família, teria sido, antes, um sínodo LGBT, tal a profusão de notícias contraditórias e a confusão difundida por Roma. E a confusão, diz-nos a Doutrina, é diabólica.
No entanto, destas últimas semanas podemos reter, no essencial, o que tem sido a Igreja na sua relação com o mundo. A Igreja pós-conciliar.

Da relação da Igreja com o mundo pelos media: profeticamente disse ainda hoje o Arcebispo Chaput, de Filadélfia, colhermos informação na imprensa é um equívoco. A imprensa, sabemo-lo, está interessada na espectacularização da dissensão e, em última análise, no ataque à Igreja. E, como a ignorância abunda nas redações, facilmente obtemos explicação para parte da confusão difundida a partir de Roma. Mas não explica toda. (E sobre esta relação Igreja/media recomendo a leitura de um post do Tiago Cavaco, pastor Baptista, no blog A Voz do Deserto, a propósito do despropósito deste Sínodo.)
Nota também para o equívoco que é a suposta abertura e «transparência» deste Sínodo em que, pela primeira vez, não foi permitida a publicação das transcrições de todas as intervenções do colégio sinodal.
Depois, vários vícios, diria dogmas, seculares, que, como também profeticamente avisou o Beato Paulo VI, são o «o fumo de Satanás no altar do Senhor». De todos eles, o maior, o da «democracia», como se esta não fosse parte, não o todo, do processo de decisão que emana da Tradição. E como se o estado das puras democracias ocidentais não fosse lamentável para que não lhes puséssemos a vista no exemplo do que é o Bem-comum sitiado por interesses particulares e divisionistas. Depois, o clássico de inspiração marxista, «conservadores» vs. «progressistas» e a concomitante acrobacia semântica que faz do conservador uma figura cavernícula a bramir a inexorável marcha do «progresso» e dos amanhãs que cantam. Também de inspiração marxista, chegamos ao núcleo do que tem sido este Sínodo dos Bispos sobre a Família visto pela imprensa: a agenda LGBT (política, portanto) já hegemónica nas redações e tornada como que uma realidade inquestionável, dogmática, diria, da contemporaneidade iluminada a povoar as consciências tomadas pelo aggiornamento permanente da Igreja.

Vamos por partes.
Experimentamos hoje uma tremenda dificuldade em ouvir sem exaltação irracional e alguma ira a doutrina tradicional da Igreja no que toca à moral sexual e familiar. No mundo hiper-sexualizado e do prazer de imediata satisfação, a mensagem da castidade e do sexo como dádiva não encaixa. O homem moderno, habituado a ver atendidos todos os seus desejos, ou antes, caprichos, resiste a aceder, muito menos compreender, o que é dito pela Igreja. A vontade de emancipação radical deste sujeito moderno leva-o à grande recusa de qualquer obstáculo que se possa interpor entre o desejo e a imediata satisfação deste. É correcto o diagnóstico que há pouco tempo fez a Conferência Episcopal Alemã, que refere, sobre a incapacidade da doutrina exposta na Humanae Vitae chegar ao coração dos homens.
Estes mesmos homens, mergulhados na mais narcotizada atmosfera cultural que o Ocidente experimentou, erguem-se, do meio do lamaçal da irracionalidade em que habita, para, com soberba e orgulho (doenças típicas de um certo modernismo), reclamar a sua subjectividade e umbigo como o novo Absoluto. O eu elevado a Deus. A egolatria que devém psicose: o capricho como forma de leitura do mundo e, consequentemente, princípio de organização do real. Daqui à construção de uma obsessiva ideia de democracia como palanque onde os outros terão imperiosamente que ouvir e cumprir a vontade do eu é um instante. Da polifonia onde se ouça a voz de cada crente, de cada homem, e que canta toda a Igreja, passamos rapidamente ao ruidoso coro da dissensão do mundo.
É este o primeiro momento do ataque à Tradição. Um ataque caucionado por uma ideologia que anuncia a tábua rasa do passado, logo da Tradição, em prol da novidade permanente. E a novidade, parece, é a homossexualidade e o adultério e as separações. Coisas nunca vistas e experimentadas pela humanidade e descobertas há coisa de 5 anos pela faróis do progresso civilizacional em gabinetes de estudos sociais da Academia Ocidental.
De que falamos quando falamos de «acolhimento» a homossexuais e a divorciados recasados? Falamos em rasgar as epístolas de Paulo? Falamos em renunciar ao anúncio sempre novo da Verdade do Evangelho na Pessoa de Cristo e dos ensinamentos (moral) que dimanam sempre fulgurantes do Salvador? Falamos em esquecer a realidade do mal e da pessoa de Satanás (e o Papa Francisco amiúde se lhe refere) e do pecado, que tantas e tantas vezes para eles somos alertados por Cristo? Falamos em abolir o 6º mandamento da Lei Mosaica? Falamos em abrir brechas na beleza da doutrina tradicional da moral sexual e familiar por causa da exigência desta, escudados na sensibilidade contemporânea do hedonismo radical? Falamos em desistir da bondade da Verdade por troca com o "bonismo" (Papa Francisco), do sentimentalismo e auto-indulgência com que vivemos? De que falamos então quando falamos em "acolhimento"?
Obviamente que o sofrimento dos irmãos, de todos os irmãos, deve ser a prioridade dessa Igreja-hospital-de-campanha anunciada pelo Papa Francisco. Deve ser a prioridade de todos nós, em obediência ao imperativo da Caridade e do Amor. Mas a Misericórdia não pode ser a erosão do rigor doutrinal, a Misericórdia não pode ser dita como novo fariseísmo que, desta vez, decorre do mundo radicalmente secular, a Misericórdia não é, jamais, contradição com a Verdade. A Misericórdia não é complacência. Muito pelo contrário.

O texto de Kasper enferma em várias contradições, ainda que possa sugerir uma nova direção pastoral sobre estas matérias. E, de caminho, abrindo o recurso à excepcionalidade e às irrepetíveis circunstâncias de cada caso (o óbvio ululante), mina, não o edifico doutrinal, mas a condenação não ao pecador mas ao pecado.
Por outro lado, é espantoso que num debate sobre moral sexual e família, no afã da novidade e de 'acompanhamento' do mundo, não se ouça uma palavra a partir da magistral Teologia do Corpo de S. João Paulo II que, recorde-se, foi uma brutal resposta a, lá está, novos problemas, entre os quais o aparecimento da SIDA, dentro dos ensinamentos da Igreja. Espantoso também como a Verdade, o mal, o pecado, a caridade (amor) são termos quase apagados da gramática do que temos ouvido ultimamente e com mais estridência de dentro da Igreja - sim, a semântica também molda a realidade.
Como disse o Cardeal Dolan, em resposta a Kasper (por acaso, ou não, autor de infelicíssimas e lamentáveis acusações às igrejas africanas), não é a Igreja que tem que ser transformada pelo mundo, é o mundo que necessita de ser transformado pela Igreja. E isso, a Igreja só o poderá fazer se proclamar com alegria a Verdade de Cristo; se permanentemente se converter a essa Verdade, ciente das suas misérias e pecados. A Igreja e todos nós.

Tudo isto deixar-nos-ia perplexos e desorientados, como se de Roma ainda erradiasse a grande recusa do Papa Bento XVI e a sede vacante fosse o estado actual da cadeira de Pedro. Não fosse a fé de que o Espírito Santo conduz a Igreja ao altar onde, santificada, seja a verdadeira esposa de Cristo.